
Nossa viagem foi planejada em meio a constantes notícias de protestos por todo o Brasil. O ano de 2014 seria de Copa do Mundo, um dos motivos pelos quais as pessoas protestavam. Quando embarquei, tudo estava um caos: aeroporto de Confins em reforma; o Galeão parecia uma zona de guerra, com tijolos, cimento, fiação à mostra, falta de ar condicionado no verão e voos absurdamente atrasados. Enquanto aguardava minha partida para Amsterdã, perdi as contas de quantas vezes ouvi as companhias aéreas anunciando atrasos de quatro, seis horas em suas decolagens. Quando retornei ao Brasil, em uma conexão com Guarulhos, aguardamos por uma hora e meia dentro do avião, pois não havia lugar para a aeronave taxiar e estacionar, causando transtorno entre nós passageiros.
Na verdade, transtorno mesmo foi procurar o guichê da companhia aérea, na qual o Gui e o Neto iriam para Copenhagen, e descobrir que os garotos não haviam nem embarcado! O voo deles, que partiria de BH, atrasou, provocando um desastre em cadeia de voos perdidos. No fim das contas, estavam em Portugal tentando embarcar no outro dia. Toda a adrenalina dispersada pela ansiedade fora em vão. Voltamos para casa, e chateada só saí de lá para regressar ao aeroporto na tarde seguinte.
Um pouco insegura, crente que outro imprevisto poderia acontecer, não me deixei levar pela empolgação. Aguardava com as bandeirinhas, pois precisariam de uma calorosa saudação de boas vindas para os ânimos. Mas outra demora… Mais de uma hora. Já estava certa de que a cena do dia anterior se repetiria. Duas horas depois, apareceram na porta de desembarque um Gui e um Neto mais murchos que bola furada e mais revoltados que time perdedor em dia de clássico: malas extraviadas, sem roupas e alguns dos equipamentos fotográficos, e um cansaço estampado em suas faces. Vamos para casa, mamãe Suzana cuidará de vocês…
O dia seguinte fora de longas conversas ao telefone, ativando o seguro-bagagem que fizemos antes de viajar. O Neto era fluente em inglês, e o Gui apenas arranhava algumas frases, embora entendesse bastante os que as pessoas diziam. Eu viraria então a tradutora oficial de casos de extrema urgência/vida ou morte do Gui – que queria pouca ajuda para aprimorar o inglês na viagem. E, assim, começamos nossa aventura: o Neto andando de bicicleta por rodovias e cidades vizinhas a Frederikssund, eu e o Gui a explorar Copenhagen.
Logo em nosso primeiro passeio, fomos expulsos do metrô por estarmos usando os bilhetes de maneira errada: eu, que já me considerava uma expert no quesito transporte público dinamarquês, descobri às duras (e vergonhosas) penas que estava fazendo tudo errado desde aquele dia do Réveillon no qual me virei para pegar meu primeiro metrô. Sem problemas! Como castigo, esperamos por trinta congelantes minutos pelo próximo metrô. E para completar nosso purgatório, dois bêbados fanfarrões se sentaram ao nosso lado e acredito que nem toda a cachaça de Salinas seria capaz de me deixar tão bêbada quanto o cheiro de álcool daqueles dois aloprados. Como em minha testa está escrito “Confusão? Pergunte-me como!”, os dois bebuns resolveram puxar papo… Um com uma tatuagem no rosto que jurava que eu e o Gui falávamos francês e o outro que tinha certeza que a venda de drogas era permitida no Brasil.
– Fiquei sabendo que é permitido consumir drogas nas ruas de Portugal, é verdade?
– Olha, eu não sei, somos brasileiros, não portugueses.
– Mas o Brasil não fica em Portugal?
– Afff…
Após muita risada por ouvir uma zoeira atrás da outra (pois a zoeira não tem limites geográficos), o tatuado revelou que era ator de filme adulto sueco, causando constrangimento entre algumas mocinhas árabes que estavam sentadas próximas a nós. Como presente, os dois zoeiras nos deram uma caixa de vinho tirada de dentro de um carrinho de bebê – que servia para carregar suas bebidas, no lugar de criança – e partiram deixando a divertida lembrança (e o cheiro de álcool) para trás.
As semanas seguintes foram para explorar a Dinamarca: eu e o Marco como exímios guias turísticos da capital e a Wendy – nossa conterrânea do sorriso mais doce e o apartamento mais aconchegante – como guia da vida noturna.

Durante nossas andanças, a Estação Central de Copenhagen era nosso principal ponto de partida! (clique na imagem para ampliar)

Você sabia que há mais bicicletas que pessoas em Copenhagen? Fonte: Instituto Brasileiro de Pesquisas Inexatas Camila Oliveira (clique na imagem para ampliar)

Às vezes, o sol resolvia aparecer. E quando isso acontece, todas as pessoas saem para as ruas para aproveitar os dias mais quentinhos… (clique na imagem para ampliar)

Esse é o Marco, e você não consegue vê-lo porque está muito ocupado fazendo sua demonstração pública de afeto (clique na imagem para ampliar)

Visitamos uma cidade chamada Hillerød, onde fica esse Palácio Real de verão. Eu tentava glamourizar para a foto, mas na verdade estava congelando e querendo matar quem inventou o inverno. (clique na imagem para ampliar)

Visitamos Roskilde, uma das cidades mais antigas da Dinamarca. As igrejas são maravilhosas e esse altar é todo em madeira e ouro! (clique na imagem para ampliar)
Eis que então partimos para uma missão diplomática na baladinha “Pixie-Pixie” – aquela mesma do réveillon –, a fim de conhecer e entender os hábitos noturnos dos dinamarqueses. Naquele dia, não se via mais aquelas pessoas receptivas… Então o Neto, nosso Embaixador da Caninha, desembainhou de sua mochila uma garrafa de cachaça, e saiu oferecendo a todos na festa.

Galera alegrinha depois de conhecer o Embaixador da Caninha =)
Quando eu disse que ainda poderíamos confiar nas pessoas, a palavra “pessoas” não incluía o Neto! No fim da noite, toda a balada dançava o “Lepo-Lepo” que, segundo Gui, seria o hit do carnaval de 2014! Enquanto isso, eu observava o Neto contando piada de português para uma turma de lusitanos, uma garota que aparava seu amigo que de tanto rir, caiu da cadeira e o Gui milagrosamente falando um inglês bem digno – pois é, no caso dele, a bebida entra e a língua estrangeira sai!

Opa! Cai da cadeira não, moço!
Finalmente, já havia chegado a época de seguir viagem e caçar a Aurora Boreal. Em nosso roteiro, deveríamos ir para Estocolmo, na Suécia. Para tanto, partiríamos de trem. E lá fomos nós embarcar na madrugada congelante em direção a Malmö, nossa primeira cidade sueca…
Até semana que vem!
Todos os artigos da série Aurora Boreal
- O Início da Jornada
- Primeiros dias num país distante
- O que aconteceu com eles?
- Suécia e Noruega
- Fim da linha?
- Prazer, eu sou a Aurora Boreal!
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