Cheguei a uma gélida Copenhagen. Eu, brasileira de coração quente, logo fiz amizade com o companheiro de poltrona ao lado, que também estava por ali como estranho – Marco, um italiano que fazia mestrado na Dinamarca, regressava para aquele país após as festas de fim de ano, enquanto todos os seus amigos viajavam de férias. O Marco não sabia muito sobre o Brasil, apenas o suficiente para ter certeza do quanto somos receptivos e alegres… Logo me ofereceu ajuda para explorar a cidade! Sim, ainda podemos confiar nas pessoas e não, o mundo não é tão perigoso quanto parece… Ou é? Talvez seja eu a sortuda de conhecer pessoas maravilhosas pelo caminho. O que importa é que aterrissei na glacial Dinamarca, numa tarde noturna de Réveillon.
Exatamente, tarde noturna! Eram quatro da tarde e tudo estava escuro, apenas as luzes dos carros nas ruas e os fogos de artifícios no céu – que são permitidos apenas na virada do ano. Que frio! A mãe do Neto me recebeu com um abraço apertado e um “Godt Nytår” (“Feliz Ano Novo”, em Dinamarquês):
– Seja bem-vinda! Agora anda logo que já estamos atrasados para a festa…
Ah… Como não me sentir em casa assim? Seguimos então para a casa dos amigos da Suzana e do Erik, em um típico jantar de Réveillon dinamarquês entre brasileiros e nativos. Tudo maravilhoso!
E, finda aquela fartura, queria um pouco de festa, afinal sou brasileira! Recorri ao Santo Whatsapp (o Santo salvador dos desesperados de última hora) e uma amiga brasileira me indicou seu colega dinamarquês para entrar em contato, pois certamente estaria festejando em algum lugar em Copenhagen. Com a (falta de vergonha na) cara e a (excessiva) coragem, procurei o tal amigo da amiga e me ofereci para participar da festa… Pôxa, parece que a palavra Brasil abre portas por lá! Fui bem recebida com abraços calorosos daqueles desconhecidos que pareciam ser meus amigos há anos. Comemos (novamente, esta era eu roliçando no meu primeiro dia de viagem, porque não brinco em serviço e minha comida favorita é: comida), conversamos, trocamos impressões acerca de cada país, expliquei sobre os protestos que estavam ocorrendo no Brasil, trocamos figurinhas sobre música, arte, cultura e comemos – eu já falei que havia comido? Pois é, comi de novo. Por fim, me chamaram para dançar.
– É pra sambar, ok!
– Mas eu não sei sambar!
– Brasileira e não sabe sambar?
– Então me mostra aí seu barco viking, filho de Odin.
– Não sou viking!
– E eu não sei sambar!
Seguimos para uma baladinha chamada Pixie-Pixie, na qual todos se abraçavam e comemoravam a virada entre pessoas tão desconhecidas e ao mesmo tempo tão amigas, já era de manhã e precisava achar meu caminho de volta pra casa.
Sem 3G, sem wifi, sem GPS. Fiquei como barata tonta tentando descobrir como pegar um metrô que não tem catraca – contam apenas com nossa honestidade de ter o bilhete em mãos. A cidade dormia, eu estava acordada e perdida. Quase uma hora depois, dois dedos do pé congelados, uma tentativa mal sucedida de montar em um cavalo sem cela que encontrei no caminho para não ter mais que caminhar, encontrei o rumo correto de casa e fui recebida com café – por acaso falei que odeio café? Retiro o que disse! – e cama quente. Como não amar essa viagem que mal começou e já considerava pakas?
Os dias passaram rapidamente, havia muito para se ver! Quantos lugares para visitar, comidas diferentes, pessoas, cultura… Meu companheiro para explorar a capital fora o Marco mesmo, aquele do avião, que, por fim, acabou virando nosso fiel escudeiro, cicerone, cozinheiro e bebedor de cachaça oficial da nossa viagem. Pois é, e há quem pensa que viajar sozinho seja sinônimo de solidão! Aprendi a fazer comida italiana, a falar palavras em dinamarquês, a andar de bicicleta em meio à chuva e neve, e ver filmes locais. Fui a museus, parques, praças e bibliotecas. Conheci a cultura local e me apaixonei a cada dois minutos pelos dinamarqueses gatinhos que passavam pela rua, até ganhei um torcicolo.
Mas cadê meus dois companheiros de viagem? Já era dia da tríade dos mosqueteiros ficar completa, que emoção! Passei a manhã ansiosa, fui para a Black Diamond (a biblioteca mais linda que já vi, que se tornou meu lugar favorito na capital) e me debrucei em livros para passar o tempo.
À tarde, seguimos para o aeroporto e, como é comum da tradição escandinava, esperamos pelo Neto e o Gui com bandeirinhas do Brasil e Dinamarca em mãos, como sinal de boas vindas àquele país.
Incomunicáveis desde que partiram do Brasil, sabíamos o número e horário do voo e a aeronave já se encontrava em solo! Esperávamos à porta de desembarque que repetidamente abria e fechava, na qual diferentes pessoas passavam, mas nada do Gui e do Neto. Bem, havia passado uma hora, estava demorando demais para eles aparecerem. O que havia acontecido? Eles não desembarcaram? Ficaram retidos na imigração? Seguimos para o guichê da companhia aérea e eis que recebemos a trágica notícia…
Até semana que vem!
Todos os artigos da série Aurora Boreal
- O Início da Jornada
- Primeiros dias num país distante
- O que aconteceu com eles?
- Suécia e Noruega
- Fim da linha?
- Prazer, eu sou a Aurora Boreal!
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